Conjuntura - o 1º Site Político de MS
O 1º site político de Mato Grosso do Sul | Quinta-feira, 10 de julho de 2025
Economia

Desequilíbrio tributário faz governo perder R$ 200 bi anuais

Estudo do Ipea fomenta debate sobre justiça tributária

Conjuntura Online
10/07/25 às 12h55
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
Notas de 100 e 200 reais (José Cruz/Arq/ABr)

No momento em que o governo trava batalhas no Congresso Nacional e no STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a cobrança de impostos, aumento de arrecadação e justiça tributária, um estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), órgão subordinado ao Ministério do Planejamento e Orçamento, aponta que discrepâncias permitidas nas regras de cobrança de impostos fazem com que o governo deixe de arrecadar, anualmente, mais de R$ 200 bilhões.

O documento Ineficiências e Iniquidades do Imposto de Renda: Da Agenda Negligenciada para a Próxima Etapa da Reforma Tributária, é do pesquisador da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea Sérgio Wulff Gobetti, cedido à Secretaria de Fazenda do Rio Grande do Sul.

Gobetti explica que o estudo se propõe a mostrar que “iniquidades perpetuadas” nas regras de cobrança de impostos geram ineficiência econômica, além de enfraquecer o princípio da progressividade, isto é, ricos pagarem mais que os pobres, proporcionalmente.

O estudo, disponível no site do Ipea, fomenta o debate sobre justiça tributária enquanto tramita na Câmara dos Deputados o PL (projeto de lei) que isenta do Imposto de Renda (IR) quem ganha até R$ 5 mil e prevê tributação mínima das altas rendas, pessoas com rendimento superior a R$ 600 anuais.

No STF, foi parar uma discussão sobre decreto do governo que aumenta a alíquota do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), após o Congresso ter derrubado a medida, alegando que o esforço para adequar as contas públicas deve ser feito por meio de corte de gastos.

Regime tributário
Uma das principais críticas apontadas pelo estudo é a diferença entre os regimes de tributação do lucro empresarial, o Simples, lucro presumido e lucro real.  

O Simples Nacional é direcionado a micro e pequenas empresas que faturam no máximo R$ 4,8 milhões anuais. O lucro presumido é para empresas que têm como limite uma receita de R$ 78 milhões. O regime lucro real se aplica a todas as demais empresas.

O Simples e o lucro presumido são regimes optativos. Essas empresas pagam IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) não proporcional ao seu lucro, mas ao seu faturamento.

A diferenciação dos regimes é uma forma de incentivar e simplificar negócios menores mas, segundo Gobetti, “houve desvirtuamento do propósito”, o que permite injustiças tributárias a partir do momento em que o sistema perde o vínculo com a real capacidade contributiva de cada indivíduo. 

“Entre os proprietários de micro e pequenas empresas, há pessoas com capacidades contributivas muito diferentes. Duas ‘pequenas empresas’ de igual faturamento podem revelar graus muito distintos de remuneração e de capacidade contributiva dos respectivos sócios completamente distintos”, aponta o estudo.

Para Gobetti, a proposta não é eliminar o regime simplificado, é resgatar a vocação original, tentando proporcionar simplificação e não uma vantagem. 

“Essa vantagem beneficia menos o empresário empreendedor, aquele que está investindo, se arriscando. Estou beneficiando o menos empreendedor, aquele que investe menos e lucra mais”.

Lucro menor
Outra falha, segundo o autor do estudo, é que empresas podem buscar brechas para fazer com que o lucro presumido seja bem menor que o real.

“Na atualidade, muitos conglomerados são formados por empresas que estão enquadradas no lucro real e outras no lucro presumido. E há evidências de que por trás dessa organização empresarial existe uma estratégia de alocar o máximo de custos nas unidades submetidas ao lucro real e, por outro lado, registrar o máximo de faturamento possível nas unidades sujeitas ao lucro presumido. Assim, por meio de uma divisão artificial de custos e receitas entre empresas do mesmo grupo, consegue-se minimizar o pagamento de impostos”, explica.

O técnico do Ipea aponta que o percentual médio de presunção do lucro é de 15,8%, enquanto o percentual médio efetivo aferido pela Receita Federal foi de 30,4% entre 2015 e 2019.

Gobetti estima que a diferença entre o imposto devido e o imposto teórico representa a renúncia de receita decorrente da política tributária especial, e totalizou em 2019, ano mais recente do cálculo, mais de R$ 200 bilhões, sendo R$ 87,7 bilhões para o Simples e R$ 115,9 bilhões para o lucro presumido.

O pesquisador conclui que, assim como diz o jargão da economia, “não existe almoço grátis”, isto é, alguém tem que pagar pelo benefício. Nesse caso, “quanto mais tratamentos favorecidos forem mantidos para certos bens e serviços maior teria de ser a alíquota do Imposto sobre Valor Agregado (IVA, novo imposto previsto na reforma tributária) sobre os não favorecidos para manter a arrecadação atual”.

“Uma alíquota mais baixa e uniformemente aplicada ou com menos exceções e discrepâncias do que temos hoje seria extremamente positiva para a competitividade da economia brasileira”, avalia Sérgio Gobetti.

Dividendos
Outro ponto destacado pelo pesquisador é a não tributação de dividendos, a fatia do lucro que as empresas distribuem para os acionistas. No Brasil os dividendos não são alvo do IR. Gobetti sugere que tributar esse valor tornaria o sistema de cobrança de impostos mais progressivo e permitiria compensações de forma a diminuir tributos em cima das empresas, melhorando o ambiente de negócios, inclusive atraindo investidores estrangeiros.

"Pode proporcionar mais competitividade à economia brasileira e maior progressividade ao Imposto de Renda, ao transferir o foco da empresa para o acionista”, defende o autor do estudo.

Segundo a pesquisa, dos 38 países da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), conhecida como clube dos países ricos, por reunir as economias mais desenvolvidas do mundo, apenas Estônia e Letônia mantêm a isenção dos dividendos. O Brasil é candidato a entrar para a organização.

Gobetti alerta também para que, caso o país decida tributar os dividendos, sejam pensadas formas de evitar que as empresas encontrem outros meios de distribuir recursos aos acionistas, assim como acontece atualmente pelo chamadoJCP ( juros sobre capital próprio). Com o JCP, a empresa distribui valor ao acionista como se fosse uma despesa, ou seja, são deduzidas do lucro tributável.

De acordo com o estudo do Ipea, o efeito fiscal do JCP foi uma perda de receita da ordem de R$ 24 bilhões em 2023.

Para ilustrar o efeito de concentração de renda, Gobetti aponta que a renda apropriada pelo 1% mais rico cresceu de 20,5% para 24,4% nos últimos 6 anos. Desse aumento de concentração, 88% foram "abocanhados" pelo 0,1% mais rico.

"O lucro das empresas cresceu muito, então podemos imaginar que passamos para um novo patamar de concentração de renda", avalia Gobetti.

Petróleo
O pesquisador da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas aproveita o estudo para sugerir uma forma de aumentar a arrecadação de um setor específico da economia, o petrolífero, descrito por ele como de “obtenção de lucros extraordinários”. 

Gobetti aconselha que haja uma cobrança extraordinária adicional quando o preço do barril de petróleo encostar na média histórica de US$ 70. Ao longo de 2025, o petróleo tipo Brent tem sido negociado em um intervalo de US$ 64 e US$ 75.

Segundo ele, na faixa de US$ 45 e US$ 57 por barril, as companhias do setor obtêm “retornos atrativos”, de pelo menos 10% sobre o capital investido. Ele aponta que poderia haver a cobrança adicional a cada patamar de alta do petróleo, com a alíquota variando de 10% a 20%.

“Com o preço internacional em torno da média histórica, o ganho de receita seria moderado, em torno de R$ 8 bilhões anuais, mas em situações extremas, como a de 2022, com Brent a US$ 100, o ganho poderia chegar a R$ 40 bilhões”, calcula.

Para ele, essa cobrança adicional “não eliminaria o ganho extraordinário dos investidores em momentos de alta do preço do petróleo, mas apenas capturaria uma pequena parte desse lucro extraordinário”. (ABr)

Últimas em Economia
VER TODAS AS NOTÍCIAS
Conjuntura - o 1º Site Político de MS
O 1º site político de Mato Grosso do Sul
Conjuntura Online - Copyright © 2004-2025. Todos os direitos reservados.