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Pequeno e profundo diário!

30/03/2017 - 08h36

Raquel Anderson

Diário em foto de reprodução (Foto: Ilustração )

Feito um bicho acuado, mais pela necessidade salvadora da irracionalidade do que pela postura preservacionista, adotada pelos animais, ela rompia o tempo, omitia o medo, guardava, sem pestanejar, o seu próprio segredo para seguir humana.


Servia o jantar, após um banho salgado com águas lacrimais, esfregava-se com o intuito de limpar a alma, o sabão de soda emprestava a sensação de estar ariada, “ariada com sabão” um pouco livre das esfregações da n...oite passada. Incertezas impediam a tomada de consciência, nada a fazer, subserviências inquestionáveis empurravam a vida, contava com a lida para viver, nada e tudo a esconder. Só conjugava o verbo obedecer.


Arrumava a lenha no fogão, circulava, nervosamente, a 45 graus no entorno dele, ajeitava o caldeirão, o leite fervendo, cuidava o pão, soprava o tição. Tudo pronto, é chegada a hora de servir...a mesa, o peão, a família, a criança sonolenta, mais tarde....tudo e nada era novidade...


Comer por último, engolir o que sobrava, mastigar ruminantemente, noite escura, sentidos animalescos, tanto faz ser gente ou outra criatura, a lua para saborear, poucas estrelas para ajudar. O ritual no meado da noite a realizar, a água no jirau, cheia de espuma, bucha vegetal, restos de comida no terreiro, sobras de doces de abóbora no prato esmaltado, mala de papelão no canto com tudo dobrado, o gosto e o amargor de cada um, o ranger da mola da cama de campanha ou do capim dentro do ralo tecido que revestia o colchão na cama patente. Tudo favorecia o vai e vem anatômico imprevisível, temeroso e ao mesmo tempo estranhamente gostoso na noite muda. Não podia respirar, permanência estática, olhos estatalados, fazer de conta que ninguém via, nada sabia, noites quentes, agonia, cama macia, sem consentimentos, o corpo doía, a alma estremecia, a vida e o espaço, o bicho é mais livre, instintos escolhem... a grama é sempre fofinha, a relva é mole, puro tesão, cobrir ou montar, copular, desespero e mansidão, macho e fêmea desafinados, cio e sincronização.


Madrugada a dentro, espasmos, sonhos, cansaço, nenhum alento....vida parada, nenhum alento....
Torcer para o dia clarear, pular cedo, o fogo acender, observar a fervura da água na chaleira de ferro....olhos embaçados, peito amassado....o tempo passado, o que virá...condição feminina de quem vive no campo, no pântano, a alma atolada....o que virá....


Relatos tardios, olhares vazios....a noite virá, angústia e dor...pensamentos ao dispor, relatos virão, a vida na mão, relatos virão...

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