Existe quem ao mundo se desnuda
Sem mostrar a sua, a minha ou a própria bunda
Existe quem no espelho se olha
E vê, através da própria imagem, refletida a vida que ignora
Existe na mente de toda gente um espelho plangente
Existe um espelho que esfrega tudo na cara e não mente
Existe um espelho, cujo reflexo, revela complexos
Que a vida teima em ofuscar, estorinhas reais, desenganos de brincar
Existe um espelho que escancara hipocrisias
Existe um espelho a mostrar que mais que o pano vale a Democracia
Existe um espelho que revela a vida sombria
Captura a imagem e o som do ronco doído de barrigas vazias
Existe um espelho revelador, dispensa alcunha do inquisidor
Existe um espelho lapidado com boa definição da imagem refletida
Um espelho que mostra a ferida exposta, sem escusas, tem as respostas
Existe um espelho impostor, estraçalha a imagem do enganador
Existe um espelho com contas a pagar, seu nome é retrovisor
Existe um espelho verdadeiro que realça ânimos e revela o torpor
Existe um espelho chanfrado ou bisotê
Que reflete imagem moderna ou démodé
Onde a aparência vale mais do que não sei o quê
E o efêmero norteia a psiquê
De quem vê apenas o irreal, o que não se crê
De quem enxerga a vida numa contínua turnê
Um dia o espelho respondeu:
Sou espelho, espelho seu
Mostro suas entranhas, suas máculas, seu breu
Tudo que roubaste do mundo e que nunca lhe pertenceu
Suas vestes me são transparentes, vejo o que há no seu eu
Ajeite-se com o que és, ajuste-se com o mundo, siga com os seus pés